De acordo com António Baião, a referência mais antiga que a respeito da vila de Dornes encontramos em documentos surge no foral de Arega, atribuído por D. Pedro Afonso (filho de el-rei D. Afonso Henriques) à referida vila em 1201 e no qual nos aparece entre as testemunhas um Dommus Fiiz prelatus a Dornas. Tal indica que já naquela época tão recuada havia uma povoação chamada de Dornas, a partir da qual viria a ser instituída uma das comendas da Ordem Militar de Nosso Senhor Jesus Cristo existentes na região. Um dos primeiros comendadores de Dornes terá sido Frei Rui Guilherme (cc. 1345), seguido de Frei Lopo Bezerra (cc. 1374), Frei Rui Gonçalves de Campos (cc. 1393) e de Rui Peres (princípios do século XV). Em 1453 temos ainda notícia de Dom Frei Gonçalo de Sousa, comendador-mór e responsável pela reedificação da Igreja de Nossa Senhora do Pranto, analisada nas duas últimas crónicas.
Mas, para além da igreja matriz, terão existido no centro da Vila outros edifícios de carácter religioso, a maioria dos quais, porém, não chegou aos nossos dias, à semelhança do que se tem averiguado para as restantes freguesias do Concelho de Ferreira do Zêzere. A documentação mais antiga refere-se, por exemplo, às capelas de Santa Catarina e de Nossa Senhora da Graça, tendo esta última funcionado como hospital para o recolhimento dos pobres. Igualmente importante parece ter sido a capela dedicada a São Guilherme, primitiva ermida de grandes dimensões localizada junto à ribeira com o mesmo nome a qual, de acordo com a Corografia Portuguesa do padre António Carvalho da Costa, já em 1712 se apresentada bastante arruinada, destelhada e desprovida de qualquer madeiramento.
Não obstante, certos templos mantiveram a sua funcionalidade apesar de sucessivamente remodelados ao longo dos tempos, tal como é o caso das capelas dedicadas a Santo António (em Dornes) e a São Sebastião (no Carril).
A capela de Santo António localiza-se próximo da escadaria de acesso à igreja de Nossa Senhora do Pranto. Trata-se de um edifício remodelado, de planta e linhas simples, cuja fachada principal é somente constituída pela entrada que dá acesso ao interior do pequeno templo. Lá dentro, para além da mesa de altar, apenas existe um nicho em cantaria localizado na parede frontal e no qual se conserva o orago: um Santo António em madeira policromada, de execução popular, que ostenta como atributos a cruz de Cristo e o Menino.
No que se refere à capela de São Sebastião, trata-se de um edifício totalmente reconstruído no ano de 1992 sobre as fundações de um primitivo templo aí existente; não obstante, preserva muitas das características da construção original, registada em desenho pela mão de Alfredo Keil. A capela localiza-se sensivelmente ao centro do lugar do Carril, sendo a entrada principal antecedida por um aprazível largo ajardinado a que se convencionou dar o nome de “largo da capela”, enquanto que junto da lateral esquerda se ergue uma casa de habitação particular.
Do ponto de vista arquitectónico, obedece à planimetria característica da região, concentrando-se o empenho decorativo na fachada principal do templo. Aí, sobre a entrada, foi aplicado um nicho em cantaria que contém uma pequena imagem do orago, esculpida em pedra calcária. Por sua vez, o campanário que no edifício primitivo se erguia a partir da empena, deu lugar a uma nova torre sineira provida de quatro arcos campanários, estrutura de dimensões desproporcionais relativamente à singeleza arquitectónica da capelinha.
O interior é de nave única, cobertura madeirada em masseira e pavimento recoberto a mosaico cerâmico, existindo um passadiço lajeado que se prolonga desde a entrada até à capela-mor. O acesso a este espaço é feito através de um arco cruzeiro de volta perfeita, localizando-se a sala de sacristia numa cripta existente sob o altar. Justaposto à parede frontal existe um altar executado em talha dourada, constituído por três nichos e adornado com imagens de vulto de querubins e atlantes. O nicho central é ocupado por São Sebastião, escultura bastante repintada e de talhe rude, ladeada à esquerda por São José e, à direita, pelo Sagrado Coração de Jesus. Já na sala de sacristia conservam-se, no interior de uma vitrina, uma imagem de roca representativa de Nossa Senhora do Rosário e um Menino Jesus deitado.
Por sua vez, no lugar da Frazoeira existe uma outra capela, dedicada a Nossa Senhora da Purificação, cujas dimensões consideráveis e a beleza da sua concepção arquitectónica a aproximam mais de uma igreja paroquial do que das pequenas capelinhas que, por todo o Concelho de Ferreira do Zêzere, se dispersam pelos vários povoados.
A fachada principal deste templo é constituída por um magnífico portal de lintel curvo, em cuja chave foram esculpidas duas conchas sobrepostas. Sobre o pórtico de entrada eleva-se um frontão curvilíneo, de claro barroquismo, que no tímpano ostenta uma insígnia coroada alusiva a Virgem Maria (letra M a que se sobrepõe um V invertido). Ladeiam o portal principal duas janelas rectangulares, igualmente de lintel curvo; por sua vez, sobre este rasga-se um janelão de frontão interrompido. Termina a fachada, delimitada por cunhais, numa empena curvilínea, ladeada por um pináculo (lado esquerdo) e por um pequeno campanário (lado direito), enquanto que ao centro se ergue uma cruz de Cristo. É necessário referir, porém, que o campanário que hoje aí se encontra não corresponde à obra original, a qual se conserva junto do portal lateral que se abre na fachada sul do templo. Por sua vez, em cada uma das laterais e perto da cobertura, que é em telhado de duas águas, rasgam-se duas janelas idênticas às que se encontram na fachada principal.
Pelo interior, de nave única, ergue-se sobre a entrada principal um coro-alto, enquanto que, na parede lateral norte, foi adossado um púlpito, obra executada em madeira e decorada por meio de marmoreados, cuja taça se ergue a partir de uma base pétrea e à qual se acede por meio de um lanço de escadas. Já o acesso à capela-mor é feito por meio de um arco cruzeiro de volta perfeita, em cujo fecho foi esculpida uma concha que ostenta a insígnia de Virgem Maria. A sala de sacristia localiza-se por detrás do altar-mor. Este espaço é coberto por meio de abóbada, enquanto que a cobertura da nave central, de três planos, é madeirada em caixotões; o pavimento é lajeado em toda a extensão do templo.
Do interior da capela de Nossa Senhora da Purificação destaca-se, em primeiro lugar, a pintura da cobertura da nave central. Realizada a óleo sobre tábua, em cada um dos quinze compartimentos foi representada uma moldura barroca, semelhante à esculpida na cantaria do frontão que sobrepuja o pórtico principal. Por sua vez, no interior de cada uma dessas molduras da cobertura, aparece uma inscrição latina alusiva às várias virtudes de Nossa Senhora (símbolos da Ladainha). Os mesmos elementos repetem-se nas pinturas da abóbada da capela-mor. Ao centro, surge novamente representada a insígnia de Nossa Senhora, delimitada por uma moldura idêntica às até então referidas. É este motivo central delimitado por outros quatro elementos associados ao culto de Nossa Senhora: o Sol, a Lua, a Torre e a Estrela de seis pontas.
O altar-mor é em talha dourada e policromada setecentista, através do qual se acede, por meio de duas portas, à sala de sacristia. Neste altar estão presentes várias imagens, igualmente datadas da centúria setecentista, e todas elas executadas em madeira policromada. No nicho central preserva-se a imagem padroeira de Nossa Senhora da Purificação, a qual representa a Virgem, ostentando nos braços o Menino que beija uma pequenina pomba branca. É a padroeira ladeada por São Joaquim (lado do Evangelho) e por Santa Ana (lado da Epístola), pais da Virgem Maria.
Ainda no lugar da Frazoeira existem outros dois templos, ambos de carácter particular, e que surgem adossados às correspondentes moradias. O primeiro trata-se da Capela da Sagrada Família e pertence à Quinta do Vínculo dos Senhores da Frazoeira, apresentando-se o templo como uma dependência alteada, que ocupa um dos extremos do edifício habitacional e que claramente se destaca do restante conjunto arquitectónico. A frontaria, que abre para a via pública, caracteriza-se pelas suas linhas equilibradas e pela proporcionalidade das formas dos seus elementos decorativos. Sobre a entrada eleva-se um janelão de sacada com gradeamento, cujo lintel é sobreposto por um frontão interrompido. Termina a empena num belíssimo frontão triangular, encimado por uma cruz de Cristo ladeada por dois pináculos, e de onde sobressaem duas goteiras de boca de canhão sobre os cunhais.
O interior é de nave única, pavimento lajeado e tecto em abóbada estucada, onde recentemente foi aplicada uma pintura mural. A passagem para a capela-mor realiza-se por meio de um desnível de dois degraus e um arco-cruzeiro de volta perfeita, em cuja cantaria existem alguns vestígios de policromia. No corpo central, oito grandes painéis de pintura azul forram as paredes, numa altura de 21 elementos, sendo as três fiadas inferiores preenchidas por azulejos de figura avulsa. Santos Simões data estes revestimentos de 1740. Aí encontram-se figurados: S. Bruno, S. Francisco de Paula e S. Basílio (lado da Epístola); S. Bernardo e S. Jerónimo (ladeando a entrada); S. Efrém, S. Paulo e S. Fulgêncio (lado do Evangelho); por esta razão é igualmente atribuía a este templo a invocação de Capela dos Seminaristas. Na capela-mor existem outros dois painéis que representam, do lado da Epístola, S. João Evangelista escrevendo sob inspiração de N.S. da Conceição e, do lado do Evangelho, S. João Baptista pregando. Estas duas composições sobrepujam, por sua vez, cada uma delas, um painel de menores dimensões, onde figuram cenas bucólicas, do tipo das que se encontram na igreja matriz do Beco e na capela do Solar de Higino Otho de Queiroz e Melo. De facto, o traço e esquema compositivo que caracterizam estes painéis acusam o trabalho de um mesmo autor, que terá produzido, na mesma época (c. 1740), para os dois templos já referidos. Para além disso, o tipo de molduras que cercam as composições azulejares são igualmente idênticas. O único factor discrepante é a existência, nesta capela, de um silhar de azulejos de figura avulsa, cuja tipologia, bem como a respectiva guarnição, não se repetem nem no Beco, nem no Solar de Higino Otho de Queiroz e Melo. O altar-mor, realizado em talha policromada setecentista, ocupa toda a parede frontal e, no nicho central, conserva-se uma Sacra Família do século XVIII esculpida em madeira.
O segundo templo é igualmente dedicado à Sagrada Família e pertence ao Solar de Higino Otho de Queiroz e Melo, tratando-se de uma dependência totalmente integrada na fachada principal do edifício habitacional, não denunciando por isso o seu carácter religioso para o exterior. Sobre a verga da porta que abre para a via pública foi incisa a data de 1766, correspondente ao ano de fundação da capela.
Pelo interior, esta é constituída por uma nave central de pavimento lajeado e tecto forrado por 22 caixotões lisos pintados a óleo com ornatos policromos que emolduram símbolos religiosos. No caixotão central, sobre o coro, está o brasão dos fidalgos: um escudo esquartelado com as armas dos Queiroses, Sousas, Melos e Vasconcelos, pintado posteriormente à decoração do templo, visto que tal brasão apenas foi concedido a Higino Otho de Queiroz e Melo a 8 de Maio de 1859. Por sua vez, os revestimentos azulejares presentes no interior do templo datam, de acordo com Santos Simões, de cerca de 1740. No século XIX, este templo foi vítima de um incêndio que devastou grande parte do seu espólio, daí que o revestimento azulejar que actualmente o preenche se encontre bastante mutilado. Este é constituído por quatro grandes painéis que representam, do lado do Evangelho, Santa Maria Madalena e Santo Onofre e, do lado da Epístola, São Bento e Santa Genoveva. Na capela-mor existe ainda um pequeno painel que representa um eremita lendo ao pé de uma árvore. Todos estes registos são cercados por uma moldura de folhagens e anjinhos e descansam sobre um silhar de anjinhos trombeteiros, igual ao que se encontra na igreja matriz do Beco. O revestimento apresenta 22 azulejos de alto, prolongando-se do corpo da capela até ao altar-mor. A porta que, do complexo habitacional, dá acesso ao coro-alto, é também emoldurada pelo mesmo tipo de barra que rodeia os painéis azulejares. A passagem para a capela-mor é realizada por meio de um arco cruzeiro de volta perfeita, onde à parede frontal foi justaposto um retábulo de talha policromada setecentista, preservando-se no nicho central um Cristo Crucificado em marfim e um grupo escultórico da Sagrada Família, cujas mãos, rostos e pés são de marfim, enquanto que os corpos são de madeira. Nas paredes laterais da ousia existem ainda dois quadros de pintura a óleo, representativos da Virgem e de Santo Onofre; de acordo com o Inventário Artístico de Portugal, este último quadro poder-se-á tratar de uma reprodução da tela de Domingos António de Sequeira que se encontra no Museu Nacional de Arte Antiga.
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